Crianças desobedientes e de comportamento hostil podem sofrer do transtorno opositor desafiador (TOD).
Caso não seja tratado, distúrbio tende a gerar consequências sérias na vida adulta.
Uma fase de rebeldia é comum a qualquer ser humano.
Não aceitar tudo que é imposto às vezes é atitude necessária e até inspiradora, não à toa se tornou um tema recorrente no cinema e na literatura.
Na infância e pré-adolescência, esse comportamento costuma ser tratado como normal, uma birra, a famosa “mania de ser do contra”.
Em alguns casos, porém, a atitude desafiadora constante na infância pode esconder um problema psiquiátrico – o transtorno opositor desafiador (TOD), que se não for tratado, tende a se transformar em problemas de conduta e até em posturas antissociais.
De acordo com o supervisor do Laboratório de Psiquiatria da Infância e da Adolescência do Hospital de Clínicas da UFPR Gustavo Dória, especialista em TOD, há sinais claros dados pela criança que permitem aos pais diferenciarem a “rebeldia sem causa” de algo mais sério.
Em geral, as crianças costumam ficar estressadas quando estão com sono ou fome, ou quando recebem um “não”, mas as que possuem TOD perdem a calma várias vezes ao dia, em situações triviais.
Também xingam os pais, falam palavrões e discutem com qualquer pessoa que não concorde com suas atitudes.
“É normal a criança fazer birra perto dos pais, mas a que apresenta o transtorno discute em qualquer ambiente. Com pais, professores, coleguinhas e até estranhos. Não suporta nenhum tipo de frustração e quando há uma mudança de rotina, ela se mostra inflexível, não aceita se adaptar”, resume Dória.
Bons parâmetros para saber se é preciso procurar ajuda especializada são a intensidade da oposição aos pais e se o transtorno causa prejuízo nas relações familiares.
Mas, principalmente, deve-se observar a persistência do comportamento: se ocorrer
- várias vezes por semana,
- por mais de seis meses,
é sinal de que um profissional especializado deve ser acionado.
Diagnóstico de TOD
De acordo com o psiquiatra e membro da Associação Brasileira de Psiquiatria Roberto Ratzke, o diagnóstico de TOD vai dos 7 anos ao início da adolescência.
“Entre os 2 e 6 anos, as áreas primitivas do cérebro, responsáveis pelo impulso, ainda são preponderantes, e a criança tem dificuldade de lidar com frustrações.
Por volta dos 7 anos, as áreas inibitórias desse comportamento, na região do córtex pré-frontal, começam a se desenvolver, e tais atitudes começam a ser controladas.”
Neste caso, se os pequenos ainda assim querem fazer tudo o que desejam, e não aceitam a autoridade exercida pelos pais, a quem vivem testando, é sinal de que o controle não está sendo exercido, e isso precisa ser trabalhado.
Os pais também precisam de ajuda, uma vez que o problema envolve toda a família e, muitas vezes, é desencadeado pela própria estrutura familiar.
Em alguns casos, TOD evolui para transtorno de conduta
Quando não tratado, o transtorno opositor desafiador (TOD) pode se agravar e, na adolescência, se transformar em um transtorno de conduta, caracterizado por atos agressivos e até infrações da lei.
“Quando não tratados, cerca de 25% dos casos evoluem para um transtorno de conduta”, diz o psiquiatra João Luiz da Fonseca Martins.
Entre os sintomas estão atos como
- mentir constantemente,
- intimidar parentes,
- amigos e estranhos,
- matar aulas,
- praticar furtos e vandalismo,
- maltratar animais,
- pôr fogo em objetos
- e até agredir fisicamente as pessoas.
Mesmo que TOD não evolua para um transtorno de conduta, pode persistir após os 18 anos e causar problemas no dia a dia, já que em muitas situações o adulto se depara com a necessidade de obedecer ordens.
“Isso pode causar problemas no emprego, por exemplo, já que a pessoa terá dificuldades de seguir as ordens de um chefe”, afirma o médico Gustavo Dória.
Tratamento do transtorno opositor desafiador (TOD)
Terapia familiar é melhor medida na maioria dos casos.
O tratamento do transtorno opositor desafiador (TOD) envolve não apenas a criança, mas também pais, irmãos e em muitos casos até tios e avós.
De acordo com o psiquiatra da clínica Uniica (Unidade Intermediária de Crise e Apoio à Vida) em Curitiba, João Luiz da Fonseca Martins, a estrutura familiar tem um papel importante no desencadeamento da doença.
“São crianças de famílias desestruturadas, com pais divorciados que não se dão bem, ou que vivem juntos, mas que deixam a criança aos cuidados de tios ou avós e se tornam ausentes”, exemplifica.
O psiquiatra Roberto Ratzke explica que quando os pais não exercem a autoridade ou desrespeitam o que foi combinado, o problema pode se agravar – casos em que o pai diz algo e a mãe expressa pensamento contrário, ou vice-versa.
“Um não pode sabotar a opinião do outro diante da criança”, diz.
De acordo com os médicos, de nada adiantam os castigos físicos e até mesmo privar a criança de algo, pois ela não entende o próprio comportamento.
É preciso aderir à terapia familiar – em torno de 20 sessões.
Já a medicação só é prescrita quando o TOD está associado a outros transtornos, como déficit de atenção (o mais comum), hiperatividade ou depressão.
Fonte: Gazeta do Povo