Pesquisa apontou provas da relação entre infecções e depressão
Muitas vezes, mau humor, depressão e falhas na memória não são culpa de problemas emocionais ou mentais. Por trás da tristeza, talvez escondam-se vírus e bactérias.
Cada vez mais, pesquisas mostram que o sistema imunológico, ao contrário do que se imaginava, está em perfeita sintonia com o nervoso.
Basta um intruso quebrar a barreira formada pelos glóbulos brancos — os soldados do organismo — para cair na corrente sanguínea e chegar ao cérebro. Lá, é capaz de provocar estragos cujas causas podem jamais serem descobertas.
O último congresso anual da Sociedade Americana de Imunologia apresentou pistas interessantes de como uma infecção pode desencadear problemas emocionais ou de comportamento — incluindo o transtorno obsessivo compulsivo.
Diversos trabalhos mostraram que as reações cerebrais variam, dependendo do tipo de microorganismo que navega pela corrente sanguínea, assim como a resposta do anticorpo que tenta combatê-lo.
Por exemplo, quando um agente infeccioso quebra a barreira do cérebro, as células de defesa relacionadas ao lúpus — doença autoimune do tecido conjuntivo — são acionadas e podem danificar o hipocampo. Essa área do cérebro está relacionada à memória.
O poder dos microorganismos exógenos sobre o cérebro foi demonstrado em um estudo feito com ratos de laboratório por pesquisadores da Universidade de Bristol e da Universidade College London, ambas na Inglaterra.
Os cientistas descobriram que a bactéria Mycobacterium vaccae, facilmente encontrada no solo, altera o comportamento de forma similar à ação de antidepressivos.
O artigo, um dos destaques científicos de 2010, foi publicado na revista especializada Neuroscience. Nesse caso, a “bactéria amiga” trouxe bem-estar, em vez de infelicidade. O que confirma a ideia de que os sistemas nervoso e imunológico estão interligados.
Segundo Chris Lowry, principal autor do estudo, o interesse pelo tema surgiu depois que foi reportado que pacientes de câncer cujo quimioterápico era composto pela bactéria apresentavam melhor qualidade de vida, sem que houvesse explicações plausíveis.
Para Lowry, ficou claro que esse efeito só poderia ser causado pela ativação de neurônios que contêm serotonina, o neurotransmissor associado à felicidade. Estudos em laboratório confirmaram a hipótese.
O cérebro dos ratos que recebiam doses da M.vaccae passou a produzir mais serotonina. Sabe-se que a falta dessa substância é um dos desencadeadores da depressão em humanos.
Chris Lowry diz que o estudo ajudou a entender por que um sistema imunológico desbalanceado pode deixar alguns indivíduos vulneráveis a distúrbios do humor.
— Pesquisas como essas são importantes para deixar cada vez mais claro o mecanismo de comunicação entre o corpo e o cérebro, além de reforçar o quanto um sistema imunológico sadio é importante para a saúde mental — disse Lowry.
Alergia e depressão
Outra pesquisa, apresentada no congresso da Associação Americana de Psiquiatria, apontou provas da relação entre infecções e depressão.
Chefe do programa de ansiedade e humor da Faculdade de Medicina da Universidade de Maryland, o médico Partam Manalai anunciou os resultados de uma pesquisa financiada pelo Instituto Nacional de Saúde dos EUA, que vincula a alergia à piora da depressão.
Segundo o psiquiatra, pacientes com distúrbios do humor que são expostos a determinados pólens tendem a ficar mais deprimidos.
— Sabemos que a depressão é um distúrbio muito comum, mas a alergia é mais ainda. Uma em cada duas pessoas podem ter algum tipo de sensibilidade alérgica e uma em cada cinco têm rinite alérgica. Quando a rinite chega a um ponto exacerbado, as pessoas ficam mais mal-humoradas, têm problemas de cognição e, de forma geral, não se sentem bem — conta.
A culpa pode estar no pólen das plantas que, durante a primavera, é mais abundante.
De acordo com o médico, diversos estudos demonstraram um pico nas taxas de suicídios nesta estação, enquanto que, no inverno, os índices caem.
Não é que os alérgicos fiquem tristes porque os sintomas pioram.
O que acontece é que, em contato com o agente que desencadeia a crise, o sistema imunológico responde com um antígeno específico, a imunoglobulina E.
Embora o anticorpo combata os efeitos do pólen, ele também acaba desencadeando problemas de humor.
— Em um grupo de pacientes, todos com alergia e depressão, um tratamento profilático para essas condições pode prevenir a piora do humor durante o pico da estação.
Nossas descobertas podem ajudar a conduzir pesquisas sobre novos agentes terapêuticos preventivos para lidar com distúrbios do humor — acredita Manalai.
Especialistas como Jonathan Kipnis, da Universidade da Virgínia-Charlotteville, alertam que as infecções e as respostas do sistema imunológico podem desencadear problemas no sistema nervoso.
Alertam, porém, que não estão atribuindo unicamente aos microorganismos a ocorrência de distúrbios mentais ou comportamentais.
Além disso, a maioria dos estudos encontra-se na fase 1, realizada somente com animais.
O que não quer dizer que, no futuro, os antidepressivos não possam ser trocados por antibióticos.
Fonte: CADERNO VIDA – ZH